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Pesquisa revela os efeitos da toxicidade causada por nanopartículas e metais em girinos

Em 28/02/25 09:55. Atualizada em 28/02/25 11:33.

Girinos foram expostos a nanopartículas de dióxido de titânio e do metal cádmio, e apresentaram altos índices de mortalidade e outras alterações 

Texto e arte: Maria Eduarda Silva 

As nanopartículas de dióxido de titânio (TiO2 NPs) e o Cádmio (Cd) são contaminantes provenientes de produções industriais em larga escala, que podem representar perigos consideráveis para o meio ambiente. As nanopartículas de dióxido de titânio, por exemplo, estão presentes em protetores solares, em que agem como filtro dos raios UV, e em pastas de dentes, em que atuam como agentes clareadores. Já o Cádmio é um metal tóxico e cancerígeno, utilizado na fabricação de baterias e na produção de pigmentos, além de também estar presente na fumaça da queima de combustíveis fósseis e cigarros, e em sedimentos urbanos. 

A contaminação na natureza por nanopartículas e metais é causada pelo descarte inadequado destas, principalmente em ambientes aquáticos, uma vez que suas partículas frequentemente se encontram em águas urbanas e industriais. O dióxido de titânio, quando encontrado em altas quantidades em sistemas de água, pode induzir mudanças comportamentais, e danos ao material genético de peixes e anfíbios que vivem nesse ambiente. 

De acordo com o professor do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP) da Universidade Federal de Goiás (UFG), Thiago Lopes, coorientador da pesquisa e membro do Laboratório de Biotecnologia Ambiental e Ecotoxicologia (LaBAE), a liberação dessas nanopartículas no meio ambiente pode afetar a biodiversidade local. Não só isso, mas essas estruturas também são capazes de se acumular em espécies utilizadas na alimentação humana, o que gera preocupações sobre o consumo de alimentos contaminados e seus efeitos na saúde humana. 

Já o cádmio, considerado um poluente persistente no meio ambiente, é capaz de se acumular no organismo dos animais, aumentando gradativamente o risco que apresenta à sua saúde. 

Apesar dos efeitos de ambos os contaminantes serem conhecidos separadamente, os efeitos dos dois combinados ainda não foram profundamente estudados, fator que motivou a pesquisa. O estudo buscou analisar se a combinação com o metal poderia ser responsável por intensificar os efeitos negativos causados pela exposição de seres aquáticos a nanopartículas de dióxido de titânio. 

A pesquisa foi realizada durante o mestrado da aluna Carolina Arantes de Moraes, no Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade Animal (PPGBAN) da UFG, sob orientação das professoras Dra. Lucélia Gonçalves e Dra. Raquel Salla e do professor Dr. Thiago Lopes Rocha. 

Mestranda Carolina
Mestranda Carolina Arantes. (Foto: Arquivo Pessoal)


O estudo foi contemplado pelo Departamento de Morfologia, do Instituto de Ciências Biológicas da UFG e pelo Laboratório de Biotecnologia Ambiental e Ecotoxicologia (LaBAE), do IPTSP, em colaboração com o Departamento de Biologia e Bioquímica da Universidade de Houston, nos Estados Unidos. 

Metódos

Para a análise, girinos de rã-touro A. catesbeiana foram coletados na fazenda comercial Laranjeiras LTDA e transportados para o Laboratório de Pesquisa em Morfologia e Ontogenia (LAMON - UFG, Goiânia, Goiás, Brasil).  Os girinos foram mantidos sob condições controladas de temperatura e alimentação. Após o período de aclimatação, foram distribuídos em três aquários para cada grupo experimental, com 20 em cada.  

Exemplar girino rã - touro
Exemplar do girino rã-touro A. catesbeiana. (Foto: Arquivo Pessoal) 

Durante as análises, foram coletados aleatoriamente para garantir uma amostragem homogênea. Os girinos foram expostos à concentrações ambientalmente relevantes das duas substâncias, tanto isoladamente quanto em mistura, durante 30 dias e em período de metamorfose. 

Resultados

A exposição de girinos rã-touro A.  catesbeiana aos contaminantes resultou em aumento da taxa de mortalidade no grupo de exposição combinada, o que demonstra o efeito sinérgico entre os dois contaminantes. 

Para analisar o efeito das substâncias nas brânquias, as lesões histopatológicas foram identificadas e classificadas de acordo com seu fator de importância. Nesse levantamento, lesões como edema intracelular (acúmulo de água no interior das células), hiperplasia (aumento do número de células em um órgão ou tecido) e ruptura da membrana celular, entre outras, foram classificadas como lesões moderadas. 

Grupo de pesquisa
Equipe do grupo de pesquisa durante o processamento das amostras.(Foto: Arquivo Pessoal) 

 

Em relação ao condrocrânio, a parte cartilaginosa do esqueleto da cabeça dos girinos, a exposição ao cádmio foi tóxica para a formação dos ossos e cartilagens mais longos do aparato braquial dos peixes, os ceratobranquiais, afetando 60% dos indivíduos.  Essa estrutura também foi afetada em 60% do grupo coexposto às nanopartículas de TiO2, o que sugere a influência do Cd no processo de desenvolvimento das projeções reticulares. 

Todos os grupos de girinos analisados, expostos a algum dos contaminantes, apresentaram alterações significativas de tamanho se comparadas ao grupo controle. No grupo de coexposição, o tamanho total dos girinos sofreu uma redução. A largura do corpo e a proporção da altura do corpo aumentaram no grupo exposto às nanopartículas de dióxido de titânio. Já no grupo exposto ao Cd, a largura da cauda pela largura do corpo sofreu diminuição.

Já foi demonstrado que, em outras espécies, o Cd causa estresse oxidativo, disfunção tireoidiana, redução da alimentação e crescimento prejudicado em girinos de diversas espécies. Quando combinado às nanopartículas de TiO2, os efeitos do metal podem ser ainda mais intensos, visto que podem aumentar a capacidade de absorção de Cd no corpo, ou intensificar a adsorção do metal.

A pesquisa demonstrou que a exposição isolada e conjunta a concentrações relevantes de nanopartículas de TiO2 e Cd causou danos às brânquias dos girinos A. catesbeiana, ao seu crescimento corporal e à formação da estrutura óssea da cabeça.   Além disso, a exposição combinada aumentou consideravelmente a taxa de mortalidade,  o que demonstra o efeito sinérgico entre os dois poluentes.

O professor Thiago Lopes, do IPTSP, destaca que a pesquisa foi pioneira na avaliação da ecotoxidade da mistura de nanopartículas de dióxido de titânio e do metal cádmio em girinos, o que destaca a importância de se estudar a interação entre os poluentes e seus efeitos combinados na saúde dos organismos aquáticos. 

“O próximo passo da pesquisa é analisar o potencial efeito da exposição crônica dos girinos a esses poluentes, e fazer novas análises para compreender melhor o mecanismo de ação e toxicidade. Por exemplo, pretendemos analisar se a exposição induz dano ao DNA dos girinos, e como as células conseguem reparar esses danos”, explica. 

O professor também ressalta que o estudo contribui com dados sobre o impacto ambiental das nanopartículas, informações importantes para o estabelecimento dos limites ambientais seguros para seu uso. 

 

*Maria Eduarda Silva é bolsista de jornalismo no projeto IPTSP Comunica e é supervisionada pela jornalista Marina Sousa.

Fonte: Comissão de Comunicação do IPTSP

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