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Estudos epidemiológicos são essenciais para enfrentar o Covid-19

Em 04/03/20 10:41. Atualizada em 04/03/20 11:43.

Professora do IPTSP/UFG comenta sobre epidemias e as medidas de prevenção contra o novo coronavírus

Professora da UFG comenta sobre epidemias e as medidas de prevenção contra o novo coronavírus

 

Muitas doenças se alastram com facilidade, mas nem por isso são classificadas como epidemias ou despertam preocupação. Explique quais são os critérios para que uma doença seja considerada uma epidemia.

Fabíola Fiaccadori - O termo epidemia é usado para caracterizar situações em que é registrada a ocorrência de uma doença com perfil infeccioso e transmissível em uma determinada região, com rápida e importante dispersão e  envolvimento de um grande número de pessoas. Ou seja, é necessário considerar uma elevação de um número de casos em um local determinado por um tempo geralmente curto, isso caracterizaria um padrão fora do esperado. 

Para avaliar o quadro indicativo de epidemia, de forma simplificada, inicialmente é necessário realizar a confirmação do diagnóstico com a identificação do agente bem como a sua associação a dados coletados a partir dos casos suspeitos envolvidos. Após a confirmação, são feitos levantamentos com relação ao período daqueles casos e os dados relativos ao local e aos indivíduos. A partir daí é possível calcular a velocidade de dispersão da doença, sua transmissão e verificar se o resultado obtido se caracteriza como epidemia. 

 

Explique um pouco sobre os índices de letalidade dos vírus e o que torna uns mais perigosos do que os outros. As mutações são um critério importante?

Fabíola Fiaccadori - Os vírus são considerados parasitas intracelulares obrigatórios. Isto quer dizer que os vírus obrigatoriamente precisam de uma célula hospedeira viva para realizar o seu ciclo replicativo. O que os vírus fazem é utilizar a célula deste hospedeiro para se multiplicar. Temos algumas famílias ou espécies de vírus que apresentam uma capacidade de se adaptar melhor às células hospedeiras dos indivíduos infectados. Isso resulta para o vírus em um maior poder infeccioso sobre o hospedeiro, e por outro lado vai caracterizar um dano tecidual maior ao organismo infectado. Isso já é conhecido para algumas espécies virais. Para exemplificar: sabemos que o vírus influenza possui um maior potencial infeccioso, atingindo  o trato respiratório inferior de forma mais eficiente que outras espécies, como os rinovírus, frequentemente associados a quadros de resfriados comuns. 

Outro aspecto a ser considerado é o processo evolutivo dos vírus. Existe um perfil de adaptação viral ao longo do tempo, considerando condições dos hospedeiros e ambiente para garantir a sua sobrevivência. Neste processo, o acúmulo de mutações leva à seleção de variantes, sendo que para algumas espécies virais, a taxa de variabilidade descrita é acentuada. Neste contexto, são selecionadas variantes virais melhores adaptadas as diferentes condições, favorecendo sua capacidade replicativa e assim, como consequência, podendo levar a um dano mais extensivo para o hospedeiro e chances de letalidade. Para o Covid-19 maiores esclarecimentos são necessários para melhor compreender os aspectos associados à patogenia da infecção.

 

Por qual motivo o Covid-19 e outros vírus nos últimos anos, como o MERS-Cov e o SARS-Cov, ganharam tanta atenção dos organismos internacionais de saúde?

Fabíola Fiaccadori - Os coronavírus pertencem a uma importante família de vírus RNA que são comuns em diferentes espécies, como morcegos, gatos e humanos. Em humanos eles são amplamente distribuídos em diferentes regiões e caracterizam sintomas parecidos com um resfriado comum em indivíduos imunocompetentes e, em geral, não causam nenhuma complicação maior. 

Entretanto, como dito, os vírus sofrem mutações ao longo do tempo e algumas espécies são conhecidas por apresentarem um perfil de variabilidade maior. Nós já conhecemos coronavírus que circulam entre humanos mas também aqueles que circularam entre outras espécies animais, os quais podem sofrer mutações e se adaptarem a novas condições. O contato muito próximo entre humanos e outras espécies animais, o que é muito frequente em regiões na China, é um fator importante na ocorrência desta variabilidade em amostras de vírus animais, tornando-os capazes de infectar humanos. Quando isso acontece, estamos diante de uma amostra viral completamente nova, já que não existe nenhuma relação destes vírus com os que já circulavam entre humanos. SARS e MERS representam exemplos de coronavírus de origem zoonótica, associados a infecção em humanos com perfil de maior gravidade e letalidade.

O que vivemos com o Covid-19 é o enfrentamento de um vírus, que pelas análises realizadas até o momento, apresentam alta identidade com o SARS-Cov de morcego. Isso caracteriza uma amostra viral nova para humanos, para a qual não apresentamos qualquer imunidade. Esta situação favorece a dispersão do agente pois ele encontra uma ampla comunidade suscetível sem nenhuma barreira imunológica. Por esse motivo há uma preocupação maior com o Covid-19, já que é um vírus novo que tem um perfil de replicação que favorece a evolução para um caso de maior gravidade principalmente nos indivíduos que apresentem algum fator de risco. 

Fale da importância dos estudos epidemiológicos e o seu impacto sobre os serviços de saúde e como a UFG enquanto instituição de pesquisa colabora com essa área?

Fabíola Fiaccadori - Os estudos epidemiológicos são determinantes no acompanhamento de situações como esta com o Covid-19, pois fornecem dados para os Órgãos de saúde, permitindo caracterizar as doenças e ainda realizar associações com o perfil de transmissão. Essas informações podem direcionar as formas de atuação e as medidas a serem tomadas. A presença da vigilância epidemiológica permite identificar precocemente, favorecendo o isolamento desses casos, a investigação dos casos suspeitos e demais providências. 

O Laboratório de Virologia e Cultivo Celular do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (LabViCC/IPTSP) tem como umas das linhas de pesquisa o trabalho com os vírus respiratórios. É feita a análise da ocorrência de vírus respiratórios em população sintomática, principalmente em crianças. Desenvolvemos estudos tanto a nível epidemiológico, mas também com foco na caracterização molecular destes agentes. Esses dados são importantes não só pra comunidade científica, mas também para as agências de saúde. 

Quais são as orientações para evitar o contágio e a propagação em geral de doenças virais respiratórias, como o Covid-19.

  • Lave com frequência as mãos com água e sabão, principalmente as partes internas, unhas e de preferência até os punhos;
  • Caso não seja possível lavar com água e sabão, utilize álcool gel;

  • Cobrir a boca ao tossir ou espirrar, utilizando a parte interna do cotovelo;

  • Para as pessoas que estiverem com sintomas respiratório, como tosse, a OMS recomenda a utilização de máscara, para evitar a transmissão;

  • A mão é o principal veículo de contaminação. Evite tocar no nariz, boca e olhos sem realização de higienização;

  • Evite locais com aglomeração de pessoas, mas na ocorrência, manter as medidas de precaução;

  • Em ambientes de compartilhamento de objetos como escolas, é aconselhada a higienização frequente desses objetos.

 

 

Fonte: Secom/UFG

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